Artigo de Almir Aguiar defende consciência negra e reparação histórica
Crédito: Seeb Rio de Janeiro
O presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro, Almir Aguiar, publicou artigo nesta terça-feira, 20 de novembro, sobre o Dia Nacional da Consciência Negra, focando a importância da data e a necessidade de reparação.
Para ele, a data "é o despertar da consciência crítica de que com a Lei Áurea milhões de sequestrados da África e seus descendentes foram libertados em 1888 do cativeiro das senzalas para serem atirados, sem qualquer política de Estado, no cativeiro maior do preconceito, nas calçadas das metrópoles, das subhabitações da desigualdade salarial e de oportunidades, e dos baixos índices das estatísticas que medem o desenvolvimento humano".
"Na vida é preciso combater o bom combate e a reparação histórica é uma luta que vale a pena ser lutada e que precisa ser trazida para o centro dos debates das questões nacionais", destaca.
Leia a íntegra do artigo de Almir Aguiar:
Consciência negra e reparação
20 de Novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra, dedicado à reflexão sobre a importância do povo africano na formação da sociedade brasileira. Mais que uma data no calendário de incontáveis feriados, é um marco que assinala o fim da consciência ingênua e do mito do agradecimento a uma princesa.
É o despertar da consciência crítica de que com a Lei Áurea milhões de sequestrados da África e seus descendentes foram libertados em 1888 do cativeiro das senzalas para serem atirados, sem qualquer política de Estado, no cativeiro maior do preconceito, nas calçadas das metrópoles, das subhabitações da desigualdade salarial e de oportunidades, e dos baixos índices das estatísticas que medem o desenvolvimento humano.
A escolha desta data não é fruto do acaso. Em 20 de novembro de 1695 Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, foi morto em combate numa emboscada na Serra dos Dois Irmãos, em Pernambuco, na defesa da liberdade de seu povo. Os quilombos representavam uma resistência organizada ao sistema escravista das elites dominantes e também uma forma de reproduzir, aqui no Brasil, um sistema da vida comunitária africana.
A reverência a Zumbi é importante passo para a democratização da galeria dos heróis nacionais, até hoje povoada por imperadores, barões, generais, todos brancos, quando o Brasil tem tantos heróis populares como João Cândido, o "almirante negro" que comandou a Revolta da Chibata, e a legião de escravos anônimos enviados para a Guerra do Paraguai, muitos deles descalços, enganados pelo Império para combater no lugar dos "filhos de família" da burguesia branca, em troca de uma alforria que não receberam - eram os Voluntários da Pátria.
Hoje, irmanados com a luta do movimento negro, estamos todos engajados em um amplo debate nacional e internacional sobre a implementação da política de reparação histórica desse processo, que foi a escravidão.
Com o avanço da luta, novos temas vêm se incorporando aos debates, como a inserção do negro no mercado de trabalho, as cotas universitárias, a discriminação por parte da polícia, a identificação de etnias, moda, gastronomia, beleza negra, etc. Dentre esses temas, um que vem sendo discutido mais profundamente ocorre no setor da economia e trata da invisibilidade do trabablhador negro.
Números recentes da Contraf-CUT informam que os negros são 35,7% da população economicamente ativa no Brasil, mas ocupam apenas 19% dos postos de trabalho no sistema financeiro. E creiam, os negros ganham em média 36% a menos do que a remuneração dos brancos. A discriminação é ainda mais grave quando se trata da mulher bancária negra.
A ideologia racista é um problema histórico da sociedade brasileira. Para vencê-la é preciso, antes de tudo, reconhecer a sua existência e as suas formas disfarçadas no mundo globalizado contemporâneo. Merece destaque histórico o gesto do ex-presidente Lula quando, em recente visita à África, ainda no exercício do mandato, pediu perdão aos africanos em nome da nação brasileira, pela barbárie do tráfico negreiro.
Com a implementação da Lei n° 10.639, de 9 de janeiro de 2003, o governo brasileiro incluiu 20 de Novembro no calendário nacional e tornou obrigatório o ensino da História e da Cultura Afro-brasileira, as lutas dos negros no Brasil e a sua importância na formação da nossa sociedade, proposta que não vem sendo cumprida. É muito pouco.
É indispensável que aprofundemos a discussão sobre a reparação histórica ao povo negro, enxergar as péssimas condições sociais em que este segmento étnico se encontra, em razão de crimes praticados em nossa História contra seus antepassados.
Na vida é preciso combater o bom combate e a reparação histórica é uma luta que vale a pena ser lutada e que precisa ser trazida para o centro dos debates das questões nacionais. Promover reflexões em torno da democracia racial e de uma educação escolar antirracista (como propôs Darcy Ribeiro) constitui estratégia que possibilitará a formação de consciências criticas capazes de uma leitura moderna da nossa História.
É também papel dos segmentos organizados da sociedade, entre eles os sindicatos de trabalhadores, refletir e apontar ações que diminuam a desigualdade e eliminem a discriminação.
Almir Aguiar
Presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro.
Fonte: Contraf-CUT com Seeb Rio de Janeiro